Saltburn | Crítica: Emerald Fennell junta You e O Talentoso Ripley num provocador drama

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Vinda do sucesso de Bela Vingança (Promissing Young Woman, 2020), Emerald Fennell despontou como uma das novas vozes do cinema quando se tratava de contar uma boa história com uma pitada de humor e crítica social ali no meio.

E a expectativa para seu segundo filme era gigante e durante muito tempo o projeto seguinte do filme que lhe rendeu um Oscar de Melhor Roteiro era vendido como uma história de obsessão. E a pergunta que ficava era: ela ia vingar? E com Saltburn (2023) não deixamos de ter nossa resposta.

E o filme é mesmo uma história de obsessão. Mas ao mesmo tempo, Saltburn é muito mais que isso, é sexy, provocante e perturbador, onde não parecia que Fennell poderia se superar depois de Bela Vingança e ela foi lá e fez.

E mesmo o que parece ser um filme que vai ser um divisivo, Saltburn consegue levantar questões e debates curiosos, onde fica claro que Fennell gosta de um desafio.

Barry Keoghan em cena de Saltburn.
Foto: Credit: Courtesy of Prime Video.

Se em Bela Vingança tínhamos uma mulher no centro e o filme era extremamente focado no movimento Me Too, em Saltburn, Fennell muda o foco, coloca um homem nos holofotes e sai de uma história mais americana, e digamos mais comercial para cair ainda mais no cinema de gênero e de cabeça na aristocracia britânica nos anos 90.

Assim, Fennell abraça a parceria com a MGM Studios que lhe garantiu um lançamento nos cinemas e com o Prime Video com um lançamento nos streaming e aposta no excêntrico, vai para o caminho mais ousado possível e pira com Saltburn.

Particularmente o maior destaque do filme é entregar uma história que realmente parece ser simples na sua execução e que você fica: Ah mas isso vai acontecer com certeza! Mas é na forma como a trama se desenvolve, como os personagens fazem as coisas aconteceram, e o texto extremamente afiado que Fennell cria para o longa que fazem o filme envelopar essa trama aparamente simples de obsessão, em alguma coisas mais complexa que mistura inveja, ganância e entrega tudo da melhor forma possível.

Alguns podem dizer que as cenas mais provocantes do longa foram feitas para chocar, por chocar e desviar a atenção da história que é contada, mas particularmente acho que os excessos estão ali para complementar a história e o tipo de história que Fennell quer contar.

Definitivamente, o filme vai ser um que o espectador vai gostar e amar, ou vai odiar. Não deve ter meio termo, você não vai sair, com ah ok, é só um filme, vi e vou continuar minha vida como acontece com diversos outros. Saltburn vai TE fazer ficar obcecado com ele, ficar preso na sua memória revisitando tudo que viu.

E em boa parte dessas passagens, a diretora/roteirista tem como aliado o ator Barry Keoghan que se firma como um dos mais empolgantes atores recém descobertos e que aqui assume a liderança efetivamente e transcende no melhor papel que já teve.

Ou pelo menos é o papel que mais Keoghan chamou atenção e parece ter se comprometido. Não é pelo fato do ator beber água de banheira (sem spoilers mas tem mais coisa nisso aí), ou deitar pelado (para dizer o mínimo) num cemitério, ou sair dançando pelado pelos corredores de Saltburn (a propriedade monumental que boa parte do filme se passa) e sim pela construção desse personagem, pela frieza de algumas cenas, mescladas com um personagem emotivo, mas extremamente perspicaz das regras do ambiente que vive. 

Allison Oliver, Jacob Elordi e Barry Keoghan em cena de Saltburn.
Foto: Credit: Courtesy of Prime Video/ Chiabella James.

Keoghan está espectacular e brilha em Saltburn como ninguém. Ele não está sozinho, mas também os outros entregam em menor escala o que Keoghan entrega aqui. E isso vai desde do objeto de fascínio do estudante Oliver de Keoghan, o colega de faculdade Felix (Jacob Elordi, no seu segundo filme no ano que ele interpreta alguém com as mesmas características) até os outros personagens que pipocam ao longo do filme.

Assim, Oliver guia o espectador para esse novo mundo, onde somos apresentados para os excêntricos Catton. Saltburn que já vinha numa pegada meio série You, com Oliver em narrativa do filme, começa a ganhar ares de O Talentoso Ripley (1999) com uma mistura de Segundas Intenções (1999) quando vemos o protagonista aprender a lidar com as dinâmicas familiares na medida que Fennell destrincha os outros membros da família.

Do mordomo esquisitão Duncan (Paul Rhys), até mesmo para a glamourosa Elspeth (Rosamund Pike, incrível), o sofisticado Sir James (Richard E. Grant), os pais de Felix, o ardiloso primo Farleigh (Archie Madekwe) e ainda a irmã de Felix, Venetia (Allison Oliver).

Na medida que o longa leva um tempo para nos introduzir e nos jogar no meio desses membros da alta sociedade, Oliver também precisa navegar entre os corredores de Saltburn para não se perder no local, e não perder a afeição que faz os moradores do lugar tem com ele. 

E Fennell abusa de cenas das mais interessantes para contar essa história e aproveitar o contexto social da época para isso. São as inúmeras festas, as idas para tomarem sol na beira do lago, as reuniões nos cômodos da mansão para falar mal dos outros (pobre Pamela, gosta da atenção), a ida para a quadra de tênis com roupa de gala, e o puxa saquismo que Oliver precisa manter para ficar nas boas graças dos Catton.

E enquanto Fennell brinca com a dualidade sobre o que Oliver está aprontando, o filme se desenvolve rapidamente onde vemos o jovem personagem viver diversos altos e baixos numa montanha russa sedutora, maluca e marcada por excelentes visuais.

Se em Bela Vingança, Fennell conseguiu imprimir uma assinatura estética, aqui em Saltburn a diretora amplia e abusa de momentos visualmente chamativos para se firmar mais uma vez nessa área, coisa que faz do longa um dos mais bonitos e caprichados do ano.

No meio de tanta beleza, ostentação e loucura, Saltburn caminha para para algumas reviravoltas que se intensificam ao longo dos momentos finais do filme e devem garantir algumas boas reflexões para tudo que Oliver e os Cotton passaram nesse verão inesquecível em Saltburn. 

No final, tanto os personagens quanto o filme em si, concluem essa história da forma mais simples possível mesmo sem deixar se impactar, deslumbrar, e nos entregar momentos dos mais malucos que tivemos no cinema em 2023, e DJ vamos colocar fogo, e tocar o terror nessa casa! 

Nota:

Saltburn chega em 22 de dezembro no Prime Video.

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