A premissa inicial de Jogo Cruzado é o que mais chama atenção da nova série do Disney+ estrelada por Carol Castro e José Loreto: colocar um ex-jogador de futebol para comentar um programa de esporte ao lado de uma jornalista e eles não se bicarem.
Mas se a ideia inicial é o que chama atenção, a série acerta por ser muito mais que só isso na medida que a temporada, com 8 episódios, se desenvolve. Jogo Cruzado teve um dos trailers mais bacanas exibidos durante o relançamento do Disney+ (quando o Star+ virou aba dentro da plataforma) e desde do ano passado a série já estava no meu radar. Mas jogo é jogo, treino é treino. E meses depois, com tudo que foi mostrado e apresentado sobre o projeto, fica claro que Jogo Cruzado entrega mesmo o que parecia ser lá atrás: um gol de placa no rol de produções nacionais a serem lançadas no Disney+.

Já que no meio de diversas outras produções que olham para os bastidores da TV (mais recentemente The Morning Show, passando por Hacks e também de certa forma O Estúdio e O Rei da TV do próprio Disney+), Jogo Cruzado acaba por entregar alguma coisa diferente sobre o tema. E se destaca por fazer isso com uma brasilidade gigante, coisa que dá um gosto ainda maior de assistir. É tipo quando o Brasil vence a Argentina, e é Copa do Mundo, sabe?
Extremamente divertida, com um humor afiado, e no ponto certo para fazer o espectador querer emplacar uma maratona, a atração faz um olhar muito bacana para a cultura futebolística do Brasil e ainda coloca essa paixão nacional para ser contada e debatida pela ótica dos bastidores de um programa de TV que fala sobre o assunto.
E ter por protagonistas que não se gostam, e que são colocados para trabalhar juntos, Jogo Cruzado também apela para uma outra paixão do brasileiro, um novelão, e que entrega um enemy to co-workers, assim por dizer, bem feitinho. O mais interessante da série é que os personagens principais são apresentados e introduzidos e vão por ganharem mais forma ao longo da temporada que se desenvolve com uma partida de futebol, onde o começo pode até soar parado, mas na medida que o jogo continua e você começa a se envolver e torcer por todos eles.
Do jogador Matheus Reis (Loreto, ótimo), o craque, o menino influenciador, o bad-boy que perde o lugar no time Fenícios Futebol Clube depois de um furo de reportagem e de um problema de saúde para a jornalista cri-cri e “certinha” Eliza Montes (Castro, igualmente ótima) que manda o chefe Laércio (Ravel Cabral, depois de se aventurar na direção com Passagrana) se lascar quando vê que vai demorar para ter sua chance de ser comentarista e depois volta como contratada do canal que trabalhou por anos.
Ambos são apresentados em suas formas arquetípicas e dentro de caixas, mas que ao longo da temporada são bem desenvolvidos, entregam bons arcos narrativos e passam a bola um para outro enquanto a série sabe contar uma boa história sobre mundo que eles vivem. Mesmo com alguns diálogos um pouco duros e algumas conveniências narrativas, Jogo Cruzado faz uma boa partida. O que chama atenção também no primeiro momento é a ótima caracterização de Loreto como Matheus, com os cabelos platinados, as tatuagens, e as gírias de efeito jogadas nas frases sem contexto nenhum que ajudam a nos conectarmos com esse jogador pela familiaridade do personagem com figuras do nosso mundo real e do mundinho dos esportes. Afinal, as semelhanças desse jogador criado por Loreto na série com qualquer jogador que já apareceu na mídia nos últimos tempos, ajuda a vender o projeto de uma forma muito interessante de acompanhar.
Esquece que o pai tá on! E não só o personagem Loreto que chama atenção não. A caracterização de Castro para a Eliza faz com que logo de cara a série mostre que vai ter esse ar mais cômico. É como se Castro emanasse uma Sandra Bullock interior, onde Eliza e a personagem da veterana de Hollywood em Miss Simpatia dariam as mãos fácil, fácil. Seja por conta do ar mais bruto, do uso de óculos, ou das mudanças de aparência para se encaixarem no padrão físico imposto pela sociedade, a Eliza de Castro é um papel e tanto para atriz que está muito bem.

E se Loreto e Castro esbanjam carisma nos papéis e estão muito bem juntos (e também separados), fica claro que Jogo Cruzado é sim também um esporte coletivo e todo mundo tem a chance de se destacar. Não é só os dois que estão bem não, a série se preocupa também em ter outros jogadores que também batem um bolão e que são fundamentais para fazer esse jogo ser um jogão e não uma bolinha de quarta-feira depois do expediente.
Quem também está muito bem também é dupla de comediantes Leandro Ramos como Lucca, o faz tudo, o ajudante, “brother” e “manager” de Matheus e a craque do jogo Luciana Paes que interpreta Susana Hartmann, a executiva/que faz leitura de chakras, chama todo mundo de amor e que chega no canal fictício Antena Esportes para movimentar as coisas na emissora. Ramos e Paes são um trunfo à parte para Jogo Cruzado e que definitivamente merecem um spin-off só deles, igual os quadros doidos que a dupla cria para alavancar a audiência do programa.
O mesmo vale para o pilhado editor Pira, do carismático Danilo Moura que sofre do outro lado da baía enquanto precisa fazer o programa dar certo e ainda lidar com o dia-a-dia no canal e os egos de todo mundo. Dos apresentadores que não se suportam, para a chegada da influenciadora Mila (Aline Dias) na equipe e ter que lidar também com Cledir, o comentarista que fica em cima do muro interpretado por Nando Cunha, e com os executivos do canal que vivem no seu cangote pressionando para fazer o programa Jogo Cruzado subir na audiência depois que Matheus e Eliza são anunciados como co-apresentadores.
E no núcleo do ex-time de futebol de Matheus, temos também outros bons personagens que movimentam a trama, como é o caso do técnico Ernesto (Roberto Birindelli) que garante bons momentos ao bater de frente com ex-jogador, como também para o ator Gabriel Santana que interpreta o jogador Kauê, um pupilo de Matheus, que tem um arco bastante interessante e que se desenvolve ao longo dos episódios da metade de temporada.

Como falamos, o humor é certeiro, e muito se dá pela forma como a série introduz, brinca e fala esse universo do esporte e do mundo do entretenimento esportivo. E que mostra, mesmo que algumas vezes de uma forma simples, alguns tópicos mais espinhosos que rodam o esporte atualmente. Jogo Cruzado faz marcação certeira na hora de apresentar esse mundo e isso se dá por um mix do bom elenco escolhido, do roteiro formado pelo time liderado por Álvaro Campos, Flavia Boggio, Leandro Muniz e Camila Kertzman, e da direção de Pedro Amorim e de Maria Farkas que garantem visualmente que a série tenha bons momentos, seja em jogos de futebol, nos bastidores do programa pelos corredores da Antena Esportes, ou ainda nas festas que acontecem para movimentar a trama. Sem celulares, nelas por favor.
Ao trazer para esse mundo ficcional nomes conhecidos do esporte, como Casagrande, Bebeto, Mauro Naves, e diversos outros, Jogo Cruzado acerta ao ambientar bem o espectador nesse universo e entrega, por conta de episódios cheios de ganchos, uma narrativa episódica que mescla uma trama com começo, meio e fim, com um arco maior para temporada. Ao deixar a bola rolar e não ficar preso numa ideia inicial que parecia, num primeiro momento, que ficaria andando em círculos, Jogo Cruzado entrega uma atração que roda numa excelente maratona e faz o quarto acerto da plataforma depois de Desejos S.A., Amor da Minha Vida e Maria & O Cangaço. Que venha o segundo tempo, quer dizer, uma segunda temporada.
Jogo Cruzado chega com 8 episódios disponíveis no Disney+ em 09 de julho.