Ratched | Crítica: Sarah Paulson não é nenhuma estranha no ninho do terror e brilha de forma assustadora

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E graças a Deus que a parceria Sarah Paulson e Ryan Murphy continua! Ninguém larga a mão de ninguém no porão. Quando foi anunciado, o projeto de contar a história da famosa enfermeira Ratched, vista no longa Um Estranho no Ninho (One Flew Over the Cuckoo’s Nest, 1975) foi recebido com um mix de empolgação e receio. O projeto da série passou por alguns problemas de desenvolvimento, onde primeiro iria falar sobre a história da enfermeira, depois iria só fazer um olhar sobre o sistema de saúde mental dos EUA, mas pelo visto, no final, uniu os dois temas.

E Ryan Murphy aqui não decepciona novamente, e com Ratched temos em 2020, juntamente com Hollywood, mais uma produção de época impecável e com uma estética visual impressionante. E além de toda essa bagagem visual que Ratched apresenta ao longo de seus 8 episódios, temos também um elenco escolhido a dedo para contar essa história de origem para a personagem que foi imortalizada pela atriz Louise Fletcher nos cinemas.

E aqui, Murphy usa uma de suas colaboradoras mais frequentes, a atriz Sarah Paulson, para dar vida para a versão mais jovem da enfermeira Mildred Ratched e contar como ela se tornou a figura polêmica e uma das profissionais de saúde/vilãs mais conhecida da história do cinema.

Ratched – Crítica 1ª temporada
Foto: Netflix

Paulson que trabalhou com Murphy em diversos projetos, com destaque para franquia American Horror Story e principalmente em uma das temporadas mais elogiadas e adorada pelos fãs, American Horror Story: Asylum, não poderia ser a escolha ideal para interpretar esse papel. A atriz não é nenhuma estranha no ninho para terror, e em Ratched, Paulson brilha de uma forma assustadoramente boa. A presença dela é magnética, emana uma força incrível e que realmente é o grande ponto de destaque para os episódios da série. Paulson constrói a sua própria figura da enfermeira Ratched desde da primeira cena, no primeiro episódio, onde a câmera pousa na personagem dentro carro, onde ela faz isso de uma forma brilhante e merecedora de todos os prêmios. O sorriso contido, a roupa meticulosamente escolhida e o ar gracioso de sua presença ajudam a criar essa figura, onde cada gesto e ação que parece ser muito pensado e cuidadosamente planejado ajudam a atriz a compor essa personagem que foi tão bem criada nos cinemas por Fletcher e que aqui ganha uma nova roupagem na tv.

Se no filme da década de 70, a grande questão era a falta de empatia, e não exibição de emoções que a enfermeira Ratched passava, na série, Paulson também faz isso, mas ao mesmo tempo demonstra uma certa humanidade para a personagem, que não chega a justificar suas ações, mas sim criar uma narrativa para mostrar o por que a enfermeira é como é, e que é contada, aos poucos, ao longo dos episódios. A figura classuda e ameaçadora de Ratched aqui continua igual, mas Paulson consegue dar mais camadas para a personagem na medida que a vemos chegar para tentar conquistar uma vaga no Hospital Estadual de Lucia na California. Em Ratched ela ainda não é a temida enfermeira de Um Estranho No Ninho, mas ao longo dos episódios vemos todos os motivos que a levaram a ser aquela pessoa que conhecemos no filme. É como se em Ratched, a enfermeira Ratched fosse um monstro em treinamento.

E antes de ser aquela personagem do filme, a série cria todo um passado para a enfermeira, conhecemos mais sua infância, seus outros relacionamentos, tanto profissionais quanto pessoais, e o motivo que a levou a ir trabalhar no tal hospital que a série se passa. Murphy e sua equipe constroem a história de uma forma que prende o espectador na cadeira de uma forma que bacana de se assistir. Mesmo que a estrutura dos episódios não seja muito propícia para a forma de exibição que a Netflix usa, Ratched nos garante boas 8 horas que não precisam ser vistas de uma vez.

Tirando os episódios Anjo Da Compaixão Parte 1 e 2 (1×03 e 1×04), a série tem episódios são pouco conectados entre si. A temporada é dividida basicamente em três grandes blocos narrativos, assim dizemos, onde temos além da história principal sub-tramas paralelas que são finalizadas e retomadas ao longo dos episódios de quase 1 hora. E Ratched segue o mesmo modelo de The Politician – também de Murphy, leia mais aqui – conta uma história nos seus primeiros episódios, e deixa seus últimos para amarrar as pontas e abrir um gancho para uma nova temporada. Mesmo que para mim, eu ficaria feliz se Ratched fosse uma minissérie e não uma série com várias temporadas.

A história contada, e a forma como os acontecimentos se desenrolaram, fazem de Ratched uma produção com começo, meio e fim, pelo menos para a passagem da enfermeira neste hospital. Os primeiros capítulos nos mostram a chegada de Mildred Ratched (Paulson) no local, juntamente com um novo um novo paciente, o assassino em série Edmund Tolleson (Finn Wittrock, ótimo), um rapaz perturbado que matou diversos padres e provocou uma enorme comoção na população da California que deseja sua morte.

Assim, esses dois personagens chegam para desestabilizar a estrutura do local, onde Ratched fará de tudo para primeiro garantir a vaga como enfermeira no local, conseguir o que quer, e colocar sua plano em prática, coisa que descobrimos logo no primeiro episódio. Vemos que Ratched é uma manipuladora incrível, e mente, mente, mente para conseguir o que quer. As reviravoltas na trama, e puxadas de tapete, e claro os percalços que Ratched passa na temporada são importantíssimos para o desenrolar do primeiro ano.

Ratched – Crítica 1ª temporada
Foto: Netflix

Ao longo dos episódios, Ratched tem inimigos que se tornam aliados e aliados que se tornam inimigos num piscar de olho. E isso vai desde dos membros do hospital como o chefe do hospital Dr. Richard Hanover (Jon Jon Briones), a enfermeira-chefe Bucket (Judy Davis, ótima), os enfermeiros Dolly (Alice Englert) uma loira fatal, e Huck (Charlie Carver) um ex-veterano de guerra, até mesmo o Governador George Wilburn (Vincent D’Onofrio) e sua assessora Gwendolyn Briggs (Cynthia Nixon) que estão em ritmo de eleição e querem tirar vantagem do hospital psiquiátrico. O apelo de Murphy ao fazer o político Wilburn lembrar Donald Trump é sentido e uma bela cutucada da produção, o mesmo vale para a excêntrica personagem de Sharon Stone como uma socialite que anda com um macaco a tira colo e tem um relacionamento conturbado com um dos personagens do hospital.

E assim, Ratched mostra a enfermeira tendo que lidar com todos eles, seus egos, as disputas de poder, e claro manipular todos eles para conseguir seus objetivos que são revelados aos poucos para nós os espectadores (fiquem de olho no episódio 6).

A série usa os diversos pacientes para nos contar um pouco sobre como os doentes mentais eram tratados nos EUA, numa época que depressão era chamada de melancolia, e o lesbianismo era tratado com uma doença neurológica, e claro as barbaridades que eram cometidas para desenvolver certos tratamentos como lobotomia e terapia com água quente em banheiras. Como série, Ratched começa bem, de uma forma intensa, e assustadora, até diríamos, e segue um pouco os moldes de American Horror Story: Asylum, mas na medida que o investigador particular Charles Wainwright (Corey Stoll) começa a se aprofundar em sua busca, o seriado acaba por focar nas tramas individuais dos personagens, começa a interligar suas histórias, se aprofundar nas diversas conspirações que eles se envolvem, e a série acaba por ganhar um tom mais novelesco do que de terror propriamente dito.

Claro, Davis como a competitiva chefe Bucket e Nixon como a astuta assessora do governo dão o tom para os episódios, assim como, Briones que como o Dr.Hanover movimenta e muito a trama com seus métodos não tão alternativos de cura para os pacientes. Todos eles tem seus esqueletos atrás do armário, e se unem com a personagem interpretada por Paulson nessa história ao mesmo tempo viciante e cheia de tensão. Ao longo dos episódios sabemos que alguma coisa de errada acontece com todos os personagens mesmo que fique escondido por trás das vestimentas verdes bem passadas, os chapéus pontudos, e o meio sorriso que as enfermeiras colocam. 

Ratched parece que homenageia os filmes antigos com uma forma estética de Alfred Hitchcock e que realmente dão um ar mais sofisticado para a série que oscila entre contar as origens da enfermeira Ratched e desenvolver as tramas para outros personagens e pacientes. Começa muito bem, se perde um pouco no meio do caminho, mas faz dois episódios finais muito bons.

No final, Ratched entrega um elegante olhar para a história de uma das personagens mais icônicas do cinema que nas mãos da competente, e mega talentosa Sarah Paulson ganha uma nova sobrevida, e deve apresentar Um Estranho no Nicho para novas gerações, a geração Netflix.

Super recomendamos fazer a maratona Um Estranho No Ninho seguida dos 8 episódios de Ratched, vocês não vão se arrepender.

Ratched chega em 18 de setembro e a Netflix cordialmente nos enviou os episódios para fazermos essa crítica.

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