Batem À Porta | Crítica: M. Night Shyamalan discute moralidade humana em intenso suspense

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O diretor M. Night Shyamalan tem, ao longo dos anos, apostado em reunir um elenco de nomes conhecidos em Hollywood para contar seus contos de suspense cheios de reviravoltas e questionamentos. Foi assim com Fragmentado (2016), Vidro (2019), Tempo (2021) e agora com Batem à Porta (Knock At The Cabin, 2023). 

Em seu novo filme, Shyamalan tenta replicar a fórmula que tem dado certo e movimentado os fãs de cinema, do film twitter, e os viciados no Letterboxd, ao longo dos anos, lançamento, após lançamento. E com Batem À Porta não é diferente.

O conceito é interessantíssimo e foi fomentado por Shyamalan nas redes sociais desde do seu anúncio: um casal e sua filha recebem a visita de 4 estranhos enquanto estão hospedados numa cabine remota. Mas a visita vem com um alerta: eles tem que escolher alguém para morrer e salvar o mundo do apocalipse. 

Batem À Porta
Ben Aldridge, Jonathan Groff e Kristen Cui em cena de Batem À Porta.
Foto: © Universal Studios. All Rights Reserved.

Assim, com essa premissa simples e sem muitos floreios, Shyamalan coloca esse grupo para discutir questões morais sobre a humanidade e tudo mais. Baseado no livro The Cabin at the End of the World do autor Paul Tremblay, talvez, Batem À Porta tenha sido melhor executado se o roteiro tivesse sido uma ideia original do diretor. Afinal, o longa parece ser muito mais convidativo enquanto, o fico foca no mistério, o próprio roteiro não está ali para destrinchar os acontecimentos que envolvem essa família e esses quatro convidados inesperados.

E Shyamalan nos últimos tempos também tem sofrido com essa moralidade, afinal, seus longas sempre marcados por ambiguidades e reviravoltas, tem, a cada projeto, soado mais mastigadinhos para tentar atingir um grande público, e ser menos cinema de nicho e mais como o mercado chama de “four-quadrant movie” ou seja, um filme para todas as faixa de público, e de todos os gêneros, e idades.

E cada vez mais Shyamalan apela para a simplicidade para contar essas histórias complexas, mesmo que o lema “quanto mais simples menos propensão ao erro” não parece funcionar com o diretor. Não estou dizendo que Batem À Porta não seja bom. É sim, é uma experiência assustadoramente tensa de se ver na telona, onde você sente o desespero, o sentimento sufocante desse casal (os ótimos Ben Aldridge e Jonathan Groff) em tentar salvar sua família, e a jovem filha do casal Wen (Kristen Cui, uma ótima atriz mirim) das garras dessas pessoas. 

O problema, ao meu ver, é que Batem à Porta esquece de trabalhar mais essa ambiguidade em sua narrativa. Será que os quatro invasores estão falando a verdade, e sim, existe a possibilidade das ações do casal, geraram consequências para o destino do mundo e da humanidade? Ou eles não passam de um bando de lunáticos presos numa espécie de culto? Batem À Porta até discute essa questão, mas a forma como explica tudo bem explicadinho para o espectador ao longo de suas nem 2 horas, é o que deixa a narrativa um pouco difícil de se comprar. 

Em nenhum momento temos uma grande revelação, alguma virada brusca na trama, ou personagens em momentos que te deixam seu queixo no chão e tudo mais. E a falta isso tudo deixa toda a atmosfera de suspense do longa ir por água abaixo. É como se Shyamalan fosse obrigado a pontuar para espectador as pistas que ele mesmo joga e apresenta, como se quisesse guiar o espectador pela história sem dar a possibilidade de escolhermos o nosso lado.

Diferente de, por exemplo e para pegar um longa mais recente, Triângulo da Tristeza que navega por uma certa ambiguidade em sua história, Batem À Porta, e Shyamalan, decidem fazer com aquilo que as coisas que são apresentadas, sejam aquilo que ele quer que sejam, e não dar para o público, uma opção de escolha. Coisa que para esse tipo de filme funcionaria muito bem. 

Batem À Porta
Abby Quinn, Nikki Amuka-Bird, Dave Bautista e Rupert Grint em cena de Batem À Porta
Foto: © Universal Studios. All Rights Reserved.

Mas sem dúvidas, Batem À Porta tem seus momentos, e é marcado por intensas e carismáticas atuações de seu elenco. Os ares teatrais, afinal, o longa se passa quase em toda sua totalidade dentro da sala da cabana que Eric (Groff) e o advogado Andrew (Aldridge) alugaram para passar um tempo com a filha deles, Batem À Porta tem diálogos muito bem escritos, questionadores sobre a situação extremamente atípica que o casal vive, onde todos os envolvidos entregam a carga de tensão necessária para o debate moral que os personagens do quarteto do apocalipse oferecem na medida que essa família é colocada contra a parede. 

E o trabalho de Shyamalan e seu time de produção para capturar essa angústia sem tamanha, é um dos pontos altos do filme. O sentimento incômodo da câmera colada na cara dos personagens, com o enquadramento de perto, o mais perto possível dos rostos dos personagens, que quase os deixam presos para não terem onde ir, e que isso se reflete na situação que eles vivem, e que se se escalona cada vez mais na medida que o líder do grupo, Leonard que diz ser um professor do ensino fundamental (Dave Bautista cada vez melhor, principalmente depois de sua passagem em Duna) começa a explicar as regras que esse grupo tem para cumprir o ritual de salvar ou não o mundo.

Bautista, seja pela sua persona imponente fisicamente ou pela sua voz grave, impõe uma ameaça maior enquanto os outros três, uma cozinheira que diz ter um filho e gostar de alimentar e servir pessoas (Abby Quinn), uma possível enfermeira com um ar acolhedor de mamãe urso (Nikki Amuka-Bird, muito boa e em seu segundo filme com Shyamalan depois de Tempo), e um operário, ex-alcoólatra e que só quer ver o resultado planejado ser feito (Rupert Grint), representam outros tipos de ameaças para o casal e sua filha.

Os flashbacks dos personagens nos ajudam a contextualizar algumas das decisões, e de como algumas das passagens do longa se desenvolvem, mesmo que em alguns momentos nos tiram da narrativa extremamente sufocante que é apresentada quando todos eles estão reunidos, presos, e amarrados na sala, e acompanham o mundo explodir pelo telejornal, na medida que eles negam não escolher um aos outros.

Batem À Porta navega também por todos os questionamentos que Eric e Andrew tem sobre a veracidade da história desse grupo, mas como falamos, acaba por soar tudo muito didático para definir os rumos da história na medida que a noite se torna violenta, e os acontecimentos fora da cabana começam a afetar a decisão que a dupla é imposta. Das alegorias bíblicas, passando pela crítica social de o que a comunidade LGBT enfrenta, até mesmo as concepções que o mundo tem dos estereótipos de diversas parcelas da população representados por essas 4 figuras invasoras, Batem À Porta, mistura, mistura e mistura tudo e parece que é um filme que se sustenta por muito pouco.

Particularmente eu esperava que em termos de narrativa, Batem À Porta, fosse mais mistério, mais paranoia, e mais tenso do que se aparenta ser. Mesmo que não deixe de ser, e entregar um filme muito bom no que se propõe. No final, Batem à Porta não deixa de ser um clássico filme M. Night Shyamalan, um divisivo e cercado de polêmicas sobre sua execução e história contada.

Avaliação: 3 de 5.

E onde assistir Batem à Porta?

Batem à Porta chega nos cinemas nacionais em 2 de fevereiro.

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